quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Confissões


Sempre tive uma certa resistência à religião. Não era a fé, em si, que me incomodava, mas o modo como a religião transforma a vida das pessoas. Guerras, restrições, hipocrisias, doutrinas, preconceitos, manipulações. Passei a encarar tudo isso com um olhar negativo.

Aprendi, desde criança, a ter uma visão crítica sobre qualquer leitura, até mesmo em textos de autores conceituados. Por que a Bíblia, então, não poderia ser questionada?

Tudo começou com a intensa propaganda religiosa que me esbarrava em qualquer canto, social e virtual. Parecia que o mundo me fazia engolir aquele bombardeio de palavras que se afirmam como verdade: eu vou para o inferno, eu não sou nada sem Deus, eu sou uma pecadora desde que nasci.


Ouvi discursos de união e compaixão de pessoas egoístas. Ouvi pessoas defendendo direitos iguais para todos e sem qualquer tolerância a ateus, homossexuais ou mesmo pessoas de outra religião. Elas acreditavam ser mais felizes, ser “gente de bem”. Aquilo não fazia sentido para mim.

A cada dia que passava, meu ceticismo se tornava mais presente. Ao mesmo tempo, me sentia mais vulnerável, entregue ao acaso. Eu nada podia controlar. Passei a ser julgada por não acreditar em nada. Em nome da liberdade, defendi arduamente meu ponto de vista, minha opinião crítica. Exigi o direito de me expressar, pela fala e pelo corpo.

Em meio a tanta resistência, percebi ter adquirido o discurso do meu próprio opressor: a intolerância. Minha luta era legítima, mas não estava nos meus planos sentir repúdio.

Sei pouco sobre religião, mas entendi que as práticas são diferentes. E, principalmente, pessoas são diferentes. Procurei ouvir mais, entender mais. O preconceito existe em diversos campos – quando um ateu diz ao religioso que este é ignorante, por exemplo –, assim como o caráter é individual, independente de religiosidade. Hoje, confesso, luto contra o meu próprio preconceito.

Não é o cristianismo que está em jogo. Não é ele que define quem somos ou nossas atitudes. A questão está na incapacidade que muitos têm de respeitar, aceitar modos e valores distintos. Não é a sua religião que quero combater, e sim a parte dela que não me tolera, a parte que fere a liberdade e escolha alheia. O mesmo vale para outros casos. Não lutamos contra brancos e homens, mas sim contra o racismo e o machismo.

Nunca entendi muito bem como uma entidade invisível pode ser tão adorada há séculos de humanidade. Porém, compreendi que existia, de alguma forma, uma crença dentro de mim, uma forma de transcender. E ela está no amor que sinto, na minha força interior, no meu olhar sobre o ser humano, na energia que minha mente proporciona ao corpo. Está na poesia que eu leio, na arte que comove. Tudo isso é impalpável. Mas, acredite no que vou lhe confessar: é real.

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