quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

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quarta-feira, 6 de julho de 2016

Orgânica

Tal qual a natureza
Ela vive.
Res-pira
des
mo
ro
na
Sucumbe.

Ela é feita de madeira,
Violeta, riacho.
Ela é fotossíntese
Seiva bruta
Erosão
Antítese!

Finda,
Ela é corpo que semeia.
Raiz partida
Estrago

Poeira.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Jatos arbitrários

Ao despertar cruel
Das marés terrenas
Golpeiam, temidas,
Covardes hienas.

Sussurram nas ondas
De ódio assombroso.
Devoram, na farsa,
O sonho do povo.

Afogam denúncias
Na contracorrente
Das armas impunes
Do sangue da gente.

Resistem os gritos
De amor
(Não escuta?)
Do mar, fez-se arte.
Da dor, faz-se luta.

domingo, 6 de março de 2016

Flores não comovem

Desde mais nova, as homenagens ao dia 8 de março já me incomodavam. Receber flores, elogios e bombons não me tornavam melhor ou mais forte. Apenas mais tarde compreendi aquele incômodo. Compreendi o quão artificial, vazio e hipócrita é o discurso de exaltação às mulheres.

Chegou o momento de pôr em cheque toda essa simbologia arcaica. Flores não nos representam: apenas nos silenciam. Chegou o momento de aprender, questionar, entender o que de fato significa a luta das mulheres por liberdade e direitos iguais. Quando ouço alguém dizer que não precisa do feminismo, que o movimento é vitimista e exagerado, eu só consigo lamentar pela falta de empatia e conhecimento.

Reproduzir o discurso de que homens e mulheres são diferentes por natureza é remontar aos séculos passados, quando a biologia era utilizada como justificativa para a escravização dos negros. Afirmar que já conquistamos todos os direitos (como o direito ao voto, por exemplo) e que não há mais desigualdade de gênero é minimizar todas as formas de violência, física e psíquica, ainda vivenciadas pelas mulheres.

Hoje, eu quero gritar ao mundo que preciso do feminismo. Eu preciso do feminismo porque, a cada 12 segundos, uma mulher é agredida e estuprada no Brasil. Eu preciso do feminismo porque, no mercado de trabalho, o salário da mulher é 30% menor que o dos homens, exercendo a mesma função.

Eu preciso do feminismo porque o Estado quer impor leis sobre o meu corpo. Porque o Brasil registra mais de 16 mil casos de feminicídio em apenas um ano – e a maior parte das vítimas é negra, pobre e homossexual (coincidência?). Eu preciso do feminismo porque sou definida e julgada pela aparência, pela sexualidade, pelas roupas que escolho usar, pelo modo de vida que escolho levar. Porque vivo na era da falsa liberdade sexual. Porque, se um dia eu decidir ser comentarista esportiva, precisarei provar o meu conhecimento para ser validada. Porque sou engolida diariamente por propagandas e mídias sexistas, em que o corpo da mulher é sexualizado e objetificado, e os estereótipos são reforçados.

Eu preciso do feminismo porque vivo aprisionada na ditadura da beleza, da maquiagem, depilação, do corpo padrão. Porque, se um dia eu for estuprada, provavelmente a roupa curta será o motivo, e a culpa será minha. Porque a sociedade quer me educar para eu ter cuidado, me preservar, “me dar valor”, enquanto o homem deveria ser ensinado a respeitar, a não estuprar. Porque, enquanto o aborto não for legalizado, mulheres continuarão morrendo sem o mínimo de assistência médica, e com a total desconsideração de suas condições financeiras e emocionais. Porque, em pleno século XXI, querem nos ditar regras de comportamento, de como agir em relação ao nosso próprio corpo. Eu preciso do feminismo porque, quando eu digo que não penso em casar ou ter filhos, as pessoas acreditam que eu não serei uma mulher completa. 

E quando digo “eu”, quero dizer “nós”. Porque a luta não é minha; é nossa.

A opressão existe. E ela é sutil, enviesada, disfarçada de piadas, cavalheirismos e assédios – e não cantadas – supostamente inocentes. Disfarçada pelo discurso patriarcal de que mulheres são frágeis, desequilibradas ou loucas. Disfarçada pela própria linguagem, quando dizemos “eles”, e não “elas”, em um grupo de 29 mulheres e apenas um homem. Fortalecida por conceitos ultrapassados que dividem mulheres entre “putas” e “santas”, com ou sem valor.

No dia 8 de março, esqueçam as flores e os elogios alienados. Um minuto de silêncio para a reflexão e o exercício da empatia e alteridade. Um minuto de silêncio para que seja ouvida a nossa voz.

O machismo não é natural. O machismo é histórico e cultural. O machismo reprime, ofende, condena, deslegitima. O machismo mata. Estamos falando do direito à vida, à escolha, à liberdade. É preciso reforçar o óbvio.

E se lutar pelo óbvio é ser radical, sejamos, pois, radicais.


sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Armadura lírica

A minha luta se dá pela palavra escrita.
Se me falta a palavra, é como se eu me faltasse também.

É assim que me ofereço ao mundo: cheia de letras, remendos, cacos de vidro. É assim que me sacrifico, como um soldado que vai à guerra. 

Minha palavra sangra, protesta, transpira. Introspectiva e consciente de sua limitação. 
Rasa, alienada, em busca de empatia. Minha palavra compõe a epiderme, meus ossos, estômago, coração. Provoca arritmia, refluxo, má digestão.

Minha palavra quer ser outra:
Menos minha
Menos silêncio
Menos resignação.

Coro, rebanho, constelação.

Mais nossa
Mais plural:
Revolução.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Desencanto

A cada esquina
Capturo uma palavra:
Dura
Áspera
Acinzentada.

Atravesso ruas
Muros
Calçadas.
Coleciono prosas
Dores e almas.

Do mais alto edifício
Do beco mais sangrento
Vou tecendo a minha flor
Concreta
No cimento.

Desprovida de metáfora
Ou qualquer simbologia
Nasce
A mais real e menos bela
Poesia.


domingo, 10 de maio de 2015

Descamação

Esvazio-me do mundo.

Recorto memórias que não são minhas.
Esqueço dores e fomes e guerras.
Decomponho-me.
Rasgo-me
Até o cerne desta fluidez.
Recolho partes que ainda me têm.

Qual foi a palavra que me cortou?
Era vinho, mas em sangue derramou.

Em mim já não cabem
Euforias e lutas outras.

Não cabe o mundo...
Este mundo que não é meu
Este mundo que é muito
Para a minha alma pouca.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Me deixa ser a Mulher

Me deixa ser a Mulher
Do cabelo queimado
Do sonho roubado
Do sorriso pintado.

Me deixa ser a Mulher
Guerreira e partida
De dia, opaca
De noite, querida.

Me deixa ser a Mulher
Que chora escondido
Que cospe, que venta
Que ama invertido.

Me deixa ser a Mulher
Da medida incerta
Da cintura torta
Da postura imprópria.

Me deixa ser
A pessoa qualquer
Do samba
Da vida

Completa... Mulher.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Confissões


Sempre tive uma certa resistência à religião. Não era a fé, em si, que me incomodava, mas o modo como a religião transforma a vida das pessoas. Guerras, restrições, hipocrisias, doutrinas, preconceitos, manipulações. Passei a encarar tudo isso com um olhar negativo.

Aprendi, desde criança, a ter uma visão crítica sobre qualquer leitura, até mesmo em textos de autores conceituados. Por que a Bíblia, então, não poderia ser questionada?

Tudo começou com a intensa propaganda religiosa que me esbarrava em qualquer canto, social e virtual. Parecia que o mundo me fazia engolir aquele bombardeio de palavras que se afirmam como verdade: eu vou para o inferno, eu não sou nada sem Deus, eu sou uma pecadora desde que nasci.


Ouvi discursos de união e compaixão de pessoas egoístas. Ouvi pessoas defendendo direitos iguais para todos e sem qualquer tolerância a ateus, homossexuais ou mesmo pessoas de outra religião. Elas acreditavam ser mais felizes, ser “gente de bem”. Aquilo não fazia sentido para mim.

A cada dia que passava, meu ceticismo se tornava mais presente. Ao mesmo tempo, me sentia mais vulnerável, entregue ao acaso. Eu nada podia controlar. Passei a ser julgada por não acreditar em nada. Em nome da liberdade, defendi arduamente meu ponto de vista, minha opinião crítica. Exigi o direito de me expressar, pela fala e pelo corpo.

Em meio a tanta resistência, percebi ter adquirido o discurso do meu próprio opressor: a intolerância. Minha luta era legítima, mas não estava nos meus planos sentir repúdio.

Sei pouco sobre religião, mas entendi que as práticas são diferentes. E, principalmente, pessoas são diferentes. Procurei ouvir mais, entender mais. O preconceito existe em diversos campos – quando um ateu diz ao religioso que este é ignorante, por exemplo –, assim como o caráter é individual, independente de religiosidade. Hoje, confesso, luto contra o meu próprio preconceito.

Não é o cristianismo que está em jogo. Não é ele que define quem somos ou nossas atitudes. A questão está na incapacidade que muitos têm de respeitar, aceitar modos e valores distintos. Não é a sua religião que quero combater, e sim a parte dela que não me tolera, a parte que fere a liberdade e escolha alheia. O mesmo vale para outros casos. Não lutamos contra brancos e homens, mas sim contra o racismo e o machismo.

Nunca entendi muito bem como uma entidade invisível pode ser tão adorada há séculos de humanidade. Porém, compreendi que existia, de alguma forma, uma crença dentro de mim, uma forma de transcender. E ela está no amor que sinto, na minha força interior, no meu olhar sobre o ser humano, na energia que minha mente proporciona ao corpo. Está na poesia que eu leio, na arte que comove. Tudo isso é impalpável. Mas, acredite no que vou lhe confessar: é real.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

De que vida estamos falando?

Pretendo, com este texto, desenvolver algumas ideias a respeito de um tema polêmico e, muitas vezes, pouco debatido: o aborto. Exponho, aqui, os argumentos que me colocam em posição favorável à legalização.

Primeiramente, uma breve explicação: ser a favor do aborto não significa querer “liberar para resolver” ou mesmo apoiar e incentivar a prática. O aborto é um procedimento desconfortável e perigoso para quem o realiza, e está longe de ser uma opção cômoda para as mulheres.

O discurso pronto que ouço daqueles que são contra é sempre o mesmo: “eu sou a favor da vida”. Daí, surge o meu questionamento: de que vida você está falando?

Pois é. Eu também sou a favor da vida. O aborto é, atualmente, a quarta maior causa de mortalidade materna no Brasil. E quem são as principais vítimas? Mulheres de classe baixa, que, em sua maioria, procuram ajuda médica em situação de desespero e clandestinidade – sem condição financeira ou emocional para criar um filho –, e ainda são taxadas de criminosas.

Assim como você, eu também defendo uma política de conscientização, educação sexual e disseminação dos métodos contraceptivos, que atinja de maneira ampla todas as classes. Eu também concordo que talvez seja a melhor solução. Mas estamos lidando com uma realidade, e não com um mundo ideal. Realidade que mata, que exige medidas urgentes e imediatas.

Ser contra o aborto não fará a prática desaparecer, independente de sua legalidade. Precisamos de um Estado que garanta condições seguras e legais para essas mulheres. Reiterando o que eu escrevi no início: não se trata de um incentivo. Estamos falando de uma situação real que compromete a saúde pública, a vida das mulheres, por falta de estrutura e descaso.

Muitos querem nos chocar com imagens de crianças mortas e nos acusam de assassinos, com o total desconhecimento do que a proposta de alteração da lei prevê: "despenalização total da interrupção voluntária da gravidez quando realizada, por opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado".

Às vezes, creio que esse tipo de acusação provém de pessoas com uma visão puramente religiosa e limitadora, que não querem enxergar para além de seus princípios. Em minha opinião, ainda não existe vida nas primeiras semanas de gravidez. Até hoje, muitos padres são contra inclusive o uso de camisinhas, alegando que isto já se configuraria uma interrupção de uma vida. Onde fica, então, o direito à liberdade e à autonomia sobre nosso próprio corpo?

Quando digo que a prática é insegura, não me refiro apenas aos riscos à integridade física da mulher. Falo também da sua história enquanto ser humano, seus sentimentos, seu presente e futuro. Falo do risco psicológico, que é igualmente importante.

Já ouvi de um homem a seguinte solução: “se não quer, é só dar para adoção depois”. Certamente, esse homem não entende nada sobre o que é ser mulher, o que significaria a gestação e o sofrimento de entregar um filho – porque aí, sim, é uma criança, um ser, uma vida. Cada um reage e sente de uma maneira. Até mesmo eu, enquanto mulher, não me sinto no direito de julgar e opinar sobre algo que não diz respeito ao meu corpo.

Afora as atuais leis já previstas para o aborto (em casa de estupro, gravidez de risco etc.), não deixo de expressar também minha visão sobre tantos outros casos. Mesmo em uma sociedade ideal, onde todos tenham acesso aos métodos contraceptivos, ainda assim eu seria a favor da causa (de acordo com o que diz a proposta de alteração da lei). Não é só a irresponsabilidade que está em jogo. Outros aspectos podem causar uma gravidez indesejada, como a troca de medicamento, o uso e a interferência de outro, a porcentagem de 0,0000...1% de chances de falha.

São possibilidades que, ainda que mínimas, não podem ser descartadas. Mesmo a mulher informada e de classe média deve ter o direito de escolher interromper ou não uma gravidez, sem deixar de lado a opinião do parceiro. Não estamos destinadas à maternidade, como muito se acreditava em séculos passados. Somos livres. Talvez falte ao mundo maior empatia e esforço para se colocar no lugar do outro, entender seus medos, suas escolhas e sua vida.